terça-feira, 4 de janeiro de 2011

A Cor da Flor




Tenho uma escrivaninha bem surrada no canto da sala, com duas gavetas pequenas. Numa gaveta guardo os óculos velhos, sem lentes, noutra um relógio do camelô quebrado. Decorando o centro da mesa tem um vaso de flores sem flores, mas com folhas. Não consigo lembrar de que cor são as flores, ou melhor, de que cor eram as flores. Ganhei o vaso de flores do seu Cardoso da padaria, ele tem lá seus cinqüenta e sete anos, mora com dona Isabel, mãe de seus dois primeiros filhos. Disse filhos? Bem, trata-se de Isabel, 25, e Belisa, 19. Isabel e Belisa são completamente o oposto uma da outra a começar pelos nomes: o prefixo de um é o sufixo do outro e vice e versa. Já provei dos dotes de Isabel, e também – que o Cardoso não ouça – já fiz uns carinhos em Belisa. Fora as duas crias, dizem por aí e principalmente no estabelecimento do Nadir, que seu Cardoso tem um filho de nove com uma angolana do centro e uma recém nascida com uma freguesa pinguça da sua "atual" padaria, donde nem o próprio diabo que amassa os pães compra lá. Apesar dos negócios do Cardoso terem quase que naufragado após a inauguração da padaria sofisticada do seu Nadir, um italiano mais com cara de judeu, o seu “boteco” ainda botava comida na boca da ninhada e saciava os bêbados que por ali baixavam.
Naquele dia, o dia em que ganhei flores, o Cardoso afogava as mágoas entre um e outro freguês...

Nenhum comentário:

Postar um comentário